História de Sophia de Mello Breyner Andresen

Dando continuidade às histórias das Escritoras da Língua Portuguesa, e mudando o sotaque, a história de hoje é sobre a poetisa portuguesa Sophia de Mello Breyner Andresen

Segundo o tradutor e amigo de Sophia, Richard Zenith, “escrever era a sua maneira de ter amor próprio”. Profundo, não é mesmo?

Vamos conhecer hoje uma mulher totalmente entrelaçada pelas palavras poéticas. Nas suas poesias revela-se quem ela de fato foi: apaixonada pelo mar e pela liberdade.

Sophia nasceu em 1919, numa família aristocrática do Porto. 

A relação de Sophia com sua mãe era pautada por uma liberdade singular para a época. Contrariando os padrões educacionais rigorosos e restritivos, ela dava aos filhos liberdade para explorar, errar e aprender por si mesmos. 

Esta atmosfera de liberdade foi repertório crucial no desenvolvimento da criatividade e do pensamento independente de Sophia. Ela aprendeu a ver no mundo uma fonte inesgotável de beleza e inspiração, mesmo diante das adversidades. 

A infância foi marcada pelo mar, que a fascinava e que mais tarde seria uma presença constante em sua obra. "O mar é sem dúvidas o meu lugar", diria Sophia em uma entrevista, refletindo sobre como o mar influenciou sua visão de mundo e sua escrita. 

A juventude de Sophia foi permeada pela consciência da opressão do regime Salazarista. Sua poesia nasce dessa tensão entre a beleza do mundo e a injustiça social, refletindo um desejo ardente por liberdade. 

Em 1944, o primeiro livro, com o mais justo dos títulos "Poesia" , significou não apenas a sua afirmação como poeta mas também como voz ativa contra o autoritarismo. Este momento foi crucial, estabelecendo sua escrita como um compromisso ético e estético. 

"Eu escrevo para desassossegar, para não consentir", sintetiza bem a sua postura.

Entre alguns dos livros de sua autoria estão: Mar Novo (1958); Livro Sexto (1962); Geografia (1967); O Nome das Coisas (1977), entre muitos outros. 

Escreveu também diversas obras de literatura infantil e afirmava que a fábula era a melhor forma de contar a realidade da vida para as crianças.

A Revolução dos Cravos em 1974 foi um marco na sua trajetória. Dizem que seu poema sobre o 25 de abril é o mais belo poema sobre a ocasião. 

Esta é a madrugada que eu esperava

O dia inicial inteiro e limpo

Onde emergimos da noite e do silêncio

E livres habitamos a substância do tempo”

Sophia não só testemunhou como participou ativamente da transição democrática, sendo eleita para a Assembleia Constituinte. Mas se desencantou com os políticos. “É uma política dominada pela exterioridade, pela vaidade e pela leviandade machista.

Em 1999, tornou-se a segunda mulher a receber o prestigioso Prêmio Camões, seguindo a brasileira, Raquel de Queiroz.

Sophia de Mello Breyner Andresen é uma figura emblemática, não só na literatura de língua portuguesa, mas como exemplo de mulher que utilizou sua voz e sua escrita para inspirar um mundo mais justo

Sua obra é um lembrete potente sobre a capacidade da poesia de mover o mundo. Acredito que uma voz capaz de ‘Ser por inteiro’ move o mundo por meio da sua verdade. Para concluir, sua escrita é, então, um lembrete para a nossa inteireza diante da vida, conforme poema a seguir que encerra este conteúdo.

A poesia não me pede propriamente uma especialização pois a sua arte é uma arte do ser. Também não é tempo ou trabalho o que a poesia me pede. Nem me pede uma ciência nem uma estética nem uma teoria. Pede-me antes a inteireza do meu ser, uma consciência mais funda do que a minha inteligência, uma fidelidade mais pura do que aquela que eu posso controlar. Pede-me uma intransigência sem lacuna. Pede-me que arranque da minha vida que se quebra, gasta, corrompe e dilui uma túnica sem costura. Pede-me que viva atenta como uma antena, pede-me que viva sempre, que nunca me esqueça. Pede-me uma obstinação sem tréguas, densa e compacta.

Pois a poesia é a minha explicação com o universo, a minha convivência com as coisas, a minha participação no real, o meu encontro com as vozes e as imagens. Por isso o poema não fala de uma vida ideal mas sim de uma vida concreta: ângulo da janela, ressonância das ruas, das cidades e dos quartos, sombra dos muros, aparição dos rostos, silêncio, distância e brilho das estrelas, respiração da noite, perfume da tília e do orégão.”

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