Preciso dizer que fui movida a desbravar o tema do mês: As Artistas Têxteis, após minha própria vivência pessoal dos últimos meses. Na verdade, acredito que nunca é desprovida de auto-referência aquilo que escolho partilhar aqui.
Duas mulheres foram as inspiradoras principais para trazer as histórias deste mês ao mundo: A Fran (@obordoatelie) que lidera a Roda de Bordado mais apaixonante aqui do Porto e me mantém em constante proximidade com esse saber e a Estefânia (@subtrama_) com quem tive o prazer de ter aulas totalmente mindblowing sobre os têxteis e todo um universo que cabe dentro desse tema, que é belo, controverso e sensível.
Quero começar com a história da Gunta Stölzl, que descobri há alguns anos, uma visionária do design têxtil, que desempenhou um papel crucial na transformação da oficina têxtil da Bauhaus, estabelecendo a tecelagem como uma forma de arte moderna e expressiva.
Também não é por acaso que começo por ela. Quando comecei a bordar em 2020, foram as suas obras de tecelagem que inspiraram um bordado que só vim a terminar esse ano (2024).
Dito isso, vamos ao fio dessa história…
Desafiando Convenções
A história de Gunta é uma história marcada pela elevação do têxtil e o papel feminino ao patamar de reconhecimento numa época em que as mulheres eram relegadas aos bastidores do mundo artístico.
Nascida em Munique em 1897, ela iniciou seus estudos em pintura de vidro, artes decorativas e cerâmica, em 1914. Seus estudos, no entanto, são interrompidos pela guerra. Ela se oferece para trabalhar como enfermeira da Cruz Vermelha.
Primeiros Anos na Bauhaus
Ao retomar os estudos, após a Guerra, ela encontra o manifesto da Bauhaus. Decide, então, fazer as aulas de verão para obter sua aceitação experimental no curso preliminar de Johannes Itten. Ela não só foi aceita na Bauhaus, como também recebeu uma bolsa de estudos.
Logo nos primeiros anos ela foi percebida como uma líder do que se chamava “departamento das mulheres”, que era na verdade o departamento de tecelagem.
Após aprimorar seus estudos por conta própria, já que Georg Muche, que era o chefe da oficina de tecelagem na época, tinha muito pouco interesse no próprio artesanato, ela começa a orientar os alunos ainda que não oficialmente.
Mestre na Bauhaus
Como o ambiente na Bauhaus de Weimar era muito propício para que os alunos ensinarem uns aos outros, Gunta foi ganhando espaço de liderança.
Ela assume o papel de mestre oficialmente somente em 1927, com a saída de Muche. Na sua prática artística começou a tentar afastar as conotações de "trabalho feminino" de sua arte, aplicando o vocabulário usado na arte moderna e movendo-se cada vez mais na direção do design industrial. Ela também foi responsável por incluir nas instruções técnicas aulas de matemática.
Gunta criou ainda o primeiro projeto conjunto entre a escola e a empresa têxtil Berlim Polytex, que teceu e vendeu os designs da Bauhaus. O departamento de tecelagem foi a principal fonte de financiamento da Escola e o mais bem sucedido sob a direção de Stölzl.
Inovação
Com espírito pioneiro, ela introduziu novas técnicas e materiais na produção têxtil. Experimentou com materiais não convencionais e explorou as possibilidades estruturais dos tecidos.
Também foi pioneira no desenvolvimento de técnicas têxteis que permitiram a produção em massa, ao mesmo tempo em que mantinha um alto padrão estético, um equilíbrio que era central para os ideais do Bauhaus de beleza aliada à funcionalidade.
Tecendo o Futuro
Gunta é demitida da escola devido à atmosfera política da época, pouco antes da Escola ser de fato fechada pelos nazistas. Ela se muda para Zurique onde abre a sua própria empresa de tecelagem manual.
O impacto de Gunta Stölzl estende-se para além dos seus próprios trabalhos e contribuições diretas. Ela ajudou a estabelecer o design têxtil como uma forma de arte respeitada.
O seu legado é visível não só nas peças que criou, que continuam a ser exibidas em museus ao redor do mundo, mas especialmente na sua abordagem experimental sobre o ensino do design têxtil.